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  • Foto do escritorJP Carvalho

Morbid Whisper, uma luta diária pelo Metal


Nascida em Brasília (DF), capital de nosso país e hoje ambientada em Parnaíba (PI), a banda Morbid Whisper, criada pelo baterista Fábio Nasc não se prendeu a distancias e segue em frente com seu Death Metal calçado, principalmente na velha escola e buscando seu lugar ao sol com apresentações e produções relevantes ao público exigente do estilo. Tivermos um bate papo com a banda e o resultado você pode conferir a seguir.

Metal no Papel: Lendo o release de vocês, vejo que a Morbid Whisper é uma banda antiga, formada em 1997. Faça um resumo desta longa caminhada até os dias de hoje.

Fábio Nasc: Na época era loucura, a gente fazia os shows underground em Brasília. Gravamos o primeiro disco e não chegamos nem a lançar. Quando foi em 1999 vim embora pra Parnaíba. Acho que 2010 comecei outra formação, mas a que está na ativa mesmo é essa desde 2016.

Artur Fontenelle: Fico imaginando o Morbid Whisper naquela época em Brasília, lugar de bandas muito foda como Violator, DFC, Macakongs 2099, Valhalla. Eu vim de São Paulo, pós turnê com a Oligarquia e não sabia como ia ser minha vida no Metal aqui no Piauí, só sei que confio no Morbid Whisper e essa formação pode chegar junto em qualquer rolê underground por aí. Fizemos alguns shows pesados, lançamos dois vídeo clipe e já estamos finalizando o segundo álbum, “Habemus Mortem”.

MNP: O primeiro registro da banda data de 1998, o álbum Morbid Whisper, e o segundo em 2017, através do single “Deafening Screams”, porque esse intervalo de tempo tão longo entre um trabalho e outro?

Artur: O Morbid Whisper teve esse longo hiato entre 1999 na mudança do Fabio Nasc de Brasília pra Parnaíba. Até então a banda tinha acabado e em 2010 ele reativou o projeto com outra formação, mas também não segurou as pontas. Foi no começo de 2016 que ele me convidou para entrar na banda, chamou o Murilo para a guitarra e no primeiro ensaio a gente já viu que deu liga. Tiramos o primeiro álbum e aí entrou o Fábio Meneses no vocal, essa formação continua até hoje. Somente quando a banda ficou mais consistente a ponto de ter um show completo com as músicas autorais que a gente começou a compor e aí veio aquele lance que é foda para qualquer banda correria do underground; falta de apoio e estrutura. Tudo que a gente produz é na raça, na unha, por nós mesmos. O Fábio vocal é um desenhista muito foda, que faz nossa comunicação (pode procurar como Ink Creations Artwork), o Murilo trabalha com eletrônica e luthieria, então cuida de tudo nosso com relação a equipamento e gravações, eu ajudo com a edição de uns vídeos e o Fábio Nasc tem o estúdio pub onde a gente ensaia, toca a maioria das vezes e toma aquela gelada.

Murilo War: A produção não vai parar, a gente pretende lançar coisa nova todo ano.

MNP: O Morbid Whisper já tocou ao lado de grandes nomes do Metal brasileiro, mesmo estando geograficamente longe das Capitais onde supostamente as coisas realmente acontecem, seria essa uma amostra de que o Heavy Metal é capaz de transpor barreiras e atingir todos os públicos ávidos por música?

Artur: A gente mora onde Judas perdeu as meias, bem longe da rota das bandas. É difícil alguém passar por aqui e a gente sofre com isso. Sempre que alguma banda mais true vem, é em trânsito entre Fortaleza, Teresina ou algum lugar do Maranhão. O primeiro show dessa formação foi com o Blackning de São Paulo em 2016. Em 2017 estávamos confirmados num show aberto na concha acústica da cidade com o NervoChaos e o Coldblood mas não conseguimos tocar porque nosso guitarrista pegou chicungunya uma semana antes, foi foda porquê teria sido o maior show do Morbid Whisper. Já tocamos com o Natural Hate e o Suffocation of Souls da Bahia, Darkside de Fortaleza, o DarkTower do Rio de Janeiro e recentemente a gente dividiu o palco com duas bandas de Brasília, o Kurgan e o Malicious Intent, banda do guitarrista do Violator. Agosto estão confirmados dois shows com o Andralls. Teresina também é um lugar onde tem algumas bandas boas como Into Mophin, Empty Grace e Deguella. Independente da dificuldade a gente já tem alguma história para contar e fazemos acontecer por nós mesmos.

MNP: O segundo trabalho de estúdio é o surpreendente “Habemus Mortem”, antecedido pelo single “You Live, You Pay”, como vem sendo a aceitação ao single e a expectativa deste lançamento?

Artur: Na verdade “Habemus Mortem” é um álbum que atrasou por conta dessa epidemia. Era para ser lançado agora no mês de abril, mas vamos reagendar, acredito que para Julho pois rolou uma parada boa nesse meio tempo que ainda não posso contar. “You live, You Pay” foi uma das primeiras músicas que compomos e ela retrata bem nossas influências. Gostamos do tradicional como Six Feet Under, Unleashed e Obituary e isso está muito explícito no nosso som. O primeiro single desse álbum foi o Deafening Screams que já deu a cara da nova formação com o clipe produzido pelo André Leão, um diretor de cinema casca grossa daqui do Nordeste. A partir daí a galera abriu os olhos para o que a banda estava apresentando e começou a colar nos shows. Daí veio o “You live, you pay” também com vídeo clipe, mas já com a masterização mais profissional feita pelo Studio Perfil, o mesmo que está mixando e que vai masterizar o álbum todo. Nele falamos de angústias, pecados e abordamos muitos temas de sofrimento. A galera recebeu bem e até então só ouvi elogios. Independente do feedback da galera, já estamos muito orgulhosos de produzir dessa forma, sem apoio nenhum e num lugar onde o Metal não tem tanta força.

MNP: A banda é muito ativa em suas redes sociais, vocês acham que neste momento adverso em que vivemos esta seria uma forma muito produtiva para se aproximar mais ainda dos fãs e do público em geral?

Artur: O mundo dá um milhão de motivos prá gente falar sobre desgraça no nosso som, acredito que o Death Metal sirva pra isso. Atividade em redes sociais é algo essencial hoje, ainda mais para nós que vivemos na esquina do mundo, o que torna muito mais difícil cairmos na estrada e realizarmos essa troca olho no olho, na interação banda e público. A Morbid Whisper fala muito de angústia, sofrimento, ego, dor e remorso. Enquanto o momento atual coloca a bancada evangélica como instrumento de manipulação de massa a gente solta um som que relembra aquela história dos abusos sexuais e pedofilia por parte de padres na igreja. Burn é uma música que apaga a fogueira com gasolina e fala do dia a dia de qualquer trabalhador sangue no olho nessa máquina de moer gente chamada capitalismo, o que envolve protestos e alguns coquetéis molotov na luta por direitos mais coerentes com o suor de cada um. Sempre tem aqueles que se identificam com letras e valorizam as bandas por motivos além da música, mas também existem aqueles que estão ali só para bater cabeça. A gente queria mesmo era sair por aí tocando, mas somos conscientes das dificuldades da cena local, então o que resta para nós é trabalhar as redes sociais e tocar com o sangue no olho em cada oportunidade que aparecer. Apesar de algumas entrelinhas para bom entendedor, o público da Morbid Whisper acaba sendo os fãs de Cannibal, Death, e as bandas do lado mais doentio do underground.

MNP: E aproveitando o gancho e esquecendo esse momento de isolamento, você acha e precariedade da economia do nosso país afeta o trabalho das bandas mais undergrounds, que sequer acham espaço para tocar?

Artur: Isso sempre afetou e o cenário sempre foi precário. O metaleiro é guerreiro por natureza, desde a essência do Metal até a correria para conseguir assistir as bandas que gostam. No underground, a maioria das bandas que eu conheço toca porque o Metal está no sangue, pela resistência ou algumas por cachaça e pelo rolê mesmo. Aqui no Piauí, novamente falando das barreiras geográficas e fragilidade na cena, existe a necessidade mínima de uma ajuda de custo para poder tocar, seja conseguindo um espaço, alugando um equipamento ou simplesmente na gasolina. Não queremos ganhar com isso. Já tocamos em alguns bares, moto clubes, alugamos galpões, mas hoje só conseguimos tocar aqui porquê nosso baterista é proprietário do Studio Nasc Pub, num esquema bem Undergound e voltado ao Rock’n Roll.

Eu nunca gostei desse lance de cachê pois sempre tive o Metal na veia, mas para nós conseguirmos tocar em Teresina, por exemplo, temos que nos deslocar quase 400 quilômetros, capotar no chão de algum estúdio que receba a gente e comer alguma marmita por lá. Agora me diz, qual produtor ou quem quer que seja vai querer desembolsar pelo menos 400,00 para ajudar nos custos da gasolina de ida e volta de uma uma banda que toca praticamente no mesmo lugar? É foda, nosso batera vive disso, eu sou autônomo e vivo na montanha russa do mercado, o mesmo com os outros dois da banda e nem sempre podemos tirar do bolso pra fazer acontecer. Daí vem o lance da produção para tentar conseguir algum patrocínio mínimo e de novo vem a pergunta. Quem vai querer patrocinar uma banda que fala só de desgraça? É osso! Mas de 50,00 em 50,00 Reais de um amigo aqui e outro ali a gente faz acontecer, produz umas camisetas com a puta arte e vende aqui ou ali, faz um clipe e posta com créditos de quem ajudou e vamos que vamos. Mas acho que o Metal serve justamente para isso, para poder passar por cima dessas e de outras dificuldades e sair de alma lavada depois do bate cabeça.

MNP: Ainda assim, você acha que se houvessem mudanças, principalmente nas pessoas, e essas passassem a ver o todo da nossa realidade financeira e com isso viessem a cobrar mais e exigir seus direitos perante os que forma eleitos para cuidar da coisa pública, haveria mudanças para melhor?

Artur: Infelizmente a eleição do atual governo derrubou a máscara de muitos e causou impacto na cena sim. O Metal em sua maior força sempre foi periférico e combustível de luta por espaços, dignidade e contra preconceitos de qualquer categoria. Enquanto muitas bandas que representam o verdadeiro espírito dessa resistência lutam para dar voz aos nossos direitos, apareceram aqueles que se identificaram com ideias corrosivas e passam um pano para racistas, homofóbicos, ditadores, torturadores e fascistas, tudo que é o oposto da verdadeira essência Underground. Não é uma questão política, mas sim humanitária. O resultado está aí para todos os lados; para aqueles que lutaram contra essa triste realidade, para os que caíram no papo e apoiaram essa farsa nacionalista e aqueles que se escondem atrás de uma neutralidade ilusória. A água bate na bunda. Hoje o atual governo vem apertando o cerco contra aqueles que realmente promovem reflexões produtivas, ou seja, os espaços plurais de cultura e liberdade de expressão. Vocês viram os shows cancelados, as bandas intimidadas na Avenida Paulista, o lance da polícia com o Escombro, o Facada Fest, enfim. Na mesma semana que estávamos gravando em Teresina um evento de música popular foi severamente cancelado com uma ação da polícia. Mais uma vez, só não vê quem não quer. Hoje, diante dessa pandemia, a galera está correndo atrás de R$ 600,00 para suas necessidades básicas, isso por que o governo queria dar apenas R$ 200,00. Essa treta financeira vem no pacote do fascismo e se já está foda para o básico imagina para a cena cultural como um todo. A galera só olha para o próprio umbigo e cobrar atitudes dos responsáveis é papel de poucos corajosos. Acho que a mudança não deve ser somente referente às exigências da realidade financeira e sim por uma boa harmonia entre as pessoas. A galera tem que ter a consciência de que a união e o respeito que faz o mundo girar e por essas e outras a gente deve gritar contra situações de opressão e desrespeito ao ser humano, justamente para garantir nosso direito de ir e vir. Consequentemente, nosso direito de tocar, de nos expressar, de nos apresentar, de ter espaço para expor nossas ideias. Já era tudo muito difícil no underground em termos financeiros e de organização antes desse governo, agora vai ficar mais difícil ainda, nessa fase pós epidemia, pois além da treta da grana ainda tem a mordaça fascista. Eu mesmo só vejo vantagens na mudança, mas infelizmente estamos colhendo o pão que o diabo amassou. Nós como banda de Death Metal vamos continuar na luta tentando entender onde podemos ou não pisar.

MNP: Muito obrigado pela entrevista e pelo seu tempo, agora o espaço é seu para suas considerações e para deixar uma mensagem aos nossos leitores.

Artur: Valorizem as bandas underground, lavem as mãos e bebam água.

Formação:

Murilo War – guitarra

Fábio Meneses – vocal

Artur Fontenelle – baixo

Fábio Nascimento – bateria

Contatos:

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